terça-feira, 29 de setembro de 2015

Os Invisíveis: um “plano-relâmpago” em quadrinhos



“Quadrinhos está mais para o Cinema que para a Literatura”, já diria Paulo Ramos.


Quem faz roteiro para quadrinhos é um pouco órfão de textos teóricos sobre produção para essa linguagem. O jeito, na sede, é apelar para o primo “rico” didático: o Cinema. Como fala Paulo Ramos, um dos acadêmicos e jornalistas especializados em quadrinhos mais conceituados do Brasil, as HQs possuem uma linguagem mais próxima das telonas que das páginas compiladas em livrarias.

Quadrinhos, muitas vezes, são um filme em sua mão. Não quero nem de longe dizer que HQs são versões impressas do Cinema somente. As linguagem são rios que se cruzam, pegam coisas de uma e colocam em outra. Tem coisa da Literatura no Cinema, do Cinema nos Quadrinhos, dos Quadrinhos no Cinema e na Literatura, e assim por diante. Não vou nem começar a falar dos games porque não haveria tempo suficiente.


Quadrinhos, Cinema, Pintura e Fotografia são artes visuais diferentes, se desenvolvem cada uma por si, mas possuem elementos gramaticais em comum. Na imagem ao lado, vemos claramente a influencia do enquadramento em “Cidade de Deus”, de Fernando Meirelles, no desenho de Lee Bermejo para a HQ “Coringa”, sob roteiros de Brian Azzarello.




O Cinema deve ao Quadrinho e vice-versa. Pequeno Nemo na Terra dos Sonhos, obra do começo do século XX, adiantou enquadramentos e efeitos que só poderiam ser visto nos filmes anos depois. Da mesma forma, o ritmo cinematográfico influencia por muitas vezes a narrativa gráfica. Em Os Invisíveis, de Grant Morrison e Steve Yeowell, podemos ver um exemplos dessas

No Cinema, planos-relâmpago são aqueles em que imagens passam uma atrás da outra, em grande velocidade, frame a frame. Os efeitos sugeridos pela montagem podem ser os mais diversos, dependendo do diretor: confusão, angústia, falta de rumo na vida do personagem, cotidiano… Mil são as possibilidades. Abaixo, uma compilação de cenas do filme Réquiem por um Sonho, de Darren Aronofsky, onde personagens se drogam através de um plano-relâmpago.


O Cinema é uma linguagem na qual a história se estabelece sobre o tempo. Terminadas a uma hora, duas, três ou quatro horas de filme, adeus. Desliga-se a projeção, a TV e foi-se filme. Nos Quadrinhos é diferente. Nas HQs, tempo É espaço. Enquanto se passam os olhos sobre a página, o tempo na narrativa se desenrola. Logo, como emular o plano-relâmpago cinematográfico em um trabalho quadrinístico? Ora, Morrison e Steve Yeowell fizeram isso em Os Invisíveis (não é de se surpreender que, assim como no vídeo acima, em uma cena em que o personagem está chapado).


A sequência rápida vem em uma página com quadros que começam grandes e vão diminuindo, como se o efeito da droga fosse sentido pelo personagem no decorrer do tempo em que o leitor está com os olhos sobre a página. É bonito de se ver a linguagem de quadrinhos sendo usada de forma tão competente e significativa.

Aliás, ler Os Invisíveis é uma bela viagem de fato.

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