por CA Ribeiro Neto - Twitter
coluna: Da nossa opção por voar
Um pedaço de mangueira de uns 70cm com as pontas coladas,
formando um círculo; dois tocos de madeiras velhas dispostos perpendicularmente
no centro do círculo de mangueira; e uma tampa de garrafa de refrigerante com
um prego segurando-a às madeiras. Esse é o volante e o único componente físico
de um carro híbrido – metade realidade, metade imaginação – do Evaldo, ou
Valdim. A andar pelas ruas do Centro, só largava uma das mãos do volante para
passar a marcha. A ultrapassagem de outro pedestre sempre acontecia pela
esquerda. Ao aproximar-se da esquina, pouco antes de parar e olhar para os
lados, começa aqueles estalos com língua: “cloc-cloc cloc-cloc”- corretamente
ligou a sinaleira para dobrar à direita.
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Leco estava esperando a hora que a coragem batesse à porta
para começar a faxina da quitinete, quando, pela janela que olha o cinza, entra
uma visitante inesperada. Uma bichana das mais atrevidas, logo se via pela cor
da vestimenta que chamamos de pele e pelos. Branca, preta e tigresa, ela queria
ser de todas as cores e dona de tudo. Olhou e fuçou tudo como quem diz: “isso
agora é meu. Esse eu deixo você usar. Esse só pode se antes pedir minha
autorização”. Subiu na cama e cheirou tudo que estava abarrotado por lá, com o
mesmo olhar experiente que os antigos latifundiários olhavam os dentes dos novos
escravos, e então olhou para o Leco com cara de que o aprovou. Alguns carinhos,
umas lambidas e pronto. Cansou. Pulou pela janela que olha o verde. Leco,
apaixonado, quando ia pensar em saudade, lembrou da faxina. Ao pegar na vassoura,
SURPRESA!, ela voltou. Leco foi adotado.
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Minha cultura vai ser mantida? Tenho obrigação
cultural de ensinar o ofício de rendeira aos meus herdeiros, ou eles têm o
direito de só gostar do que vem de fora? Cinco netos no mundo. Tantas mijadas
no meu vestido. Todos, picotos, correndo pelados no quintal, tentando pegar e
tentando fugir das galinhas. Agora estão todos com celular na mão. Tudo de
cabeça baixa, olhando pra luz. A mais velha das netas, agora, está fazendo
faculdade de estilismo. Não sei como é direito, mas só volta pra terra de vez
em quando, cheia de amigas. Aí, de repente, sem avisar nem nada, veio sozinha,
sentou ao meu lado e disse: “Vó, deixa eu te fazer umas perguntas?” – pergunto pra
quê e ela me responde com essa: “Quero estudar a sua renda lá na minha
faculdade, levar a sua renda pra lá, Vó. Quero levar sua renda comigo e
registrar tudinho. Vó, me ensina a fazer renda?”
7 comentários:
Cara... Que bonito!!
Bonito 1, 2 e/ou 3?
Adorei! Muito delicado e cheio de verdade! Visualizei esse gato! Parabéns!
Essa história do gato... muito bonita.
Sabes bem que tenho um afeto pra lá de grande pelo texto II, mas ói, me alcançou bem essa da renda, hein? Tradição pega meu ser com uma facilidade e tanto. Adorei, mano velho!
Todos os três são bons, amigo. Mas cadê a unidade? heuaheuaeh
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