domingo, 29 de novembro de 2015

Maldita Karen: uma semana para virar cada página



Maldita Karen, de Francis Ortolan

Maldita Karen é uma webcomic cujas páginas semanalmente são lançadas no Facebook de mesmo nome e no site do projeto, idealizado e realizado pelo paranaense Francis Ortolan. Karen é uma jovem estudante descendente de japoneses que adora fliperamas, luta como uma ninja, mora em uma versão fantasiosa do Brasil e tem sérios problemas de relacionamento com o resto dos seres humanos. Em entrevista realizada pelo Facebook para essa postagem, o próprio autor fala da origem da personagem. “A inspiração inicial para ela foram as várias ‘nipodescendentes’ que eu conheci na minha vida, muitas tinham uma relação complicada com a família, especialmente as que tinham famílias com os valores japoneses bem fortes”, afirma Francis. “Eu criei a Karen baseado nisso, uma garota que nasceu numa família bem tradicional mas que não se enquadra”, completa.



O que a Karen sabe fazer de melhor na vida é fazer tudo errado. Decisões difíceis, erros retumbantes, falar o que não deve na hora que não deve… A lista de defeitos da Karen chega a ser maior do que os adjetivos que acompanham os capítulos de sua vida. Ela nasceu como Desprezível Karen, no site Cosmopolia. Passou a ser a Maldita Karen em seu site e página no Facebook próprios. E os capítulos dessa fase solo de sua vida lançados até o momento tem nomes de Insensível, Cretina e Inconsequente. E o que atrai numa personagem tão negativamente adjetivada? O fato dela ser bem parecida com todos nós!

Bem, não vou falar muito sobre o desenrolar da história da Karen, acredito que vocês, caso sintam interesse, deem uma olhada no ótimo projeto de Francis
Ortolan. Quando eu conheci a Karen, suas histórias já vinham sendo publicadas há um bom tempo, o que me fez ler uma cacetada de páginas de uma vez só. É aquela sensação de que você conhece uma série na terceira ou quarta temporada e vai atrás de assistir todos os episódios anteriores para acompanhar o desenrolar da trama. Acontece que esses episódios “estocados” acabam!!! E agora, José? Agora espera a semana seguinte pra saciar a vontade.



Periodicidade e cliffhangers

Uma das estratégias mais utilizadas nas séries de TV, novelas, livros, e suportes narrativos que sugerem continuidade entre um capítulo e outro da trama é o cliffhanger. Em tradução livre, seria algo como “beira do penhasco”, o local onde se deve segurar para não cair em um desfiladeiro. Em termos narrativos, seria como o local tenso onde o leitor/espectador deve-se segurar para ficar preso e retornar no próximo episódio. A bomba vai explodir ou não? O cara atirou ou não no detetive? A heroína conseguiu ou não fugir do déspota assassino robô com cabeça de gatinho fofo? O cliffhanger é uma pergunta a ser saciada a posteriori, a questão que movimenta o suspense de uma trama (em uma ocasião futura, pretendo falar aqui no Tapioca sobre suspense e mistério, as forças de impulsão de uma história)(sentiu o cliffhanger?).

Maldita Karen é uma série cheira de cliffhangers. Toda semana, a cada nova página “virada”, a história se impulsiona um pouco, ela sai do ponto A pro ponto B, mas só veremos o ponto C dali a uma semana. Sobre a periodicidade, Francis afirma que o nascimento do seu filho acabou mudando seus planos iniciais. “No inicio, eram duas páginas por semana, o que era bem legal, mas meu filho nasceu e não deu para continuar assim. Com dois episódios por semana, o contato com o público é mais constante, mas por outro lado, com a HQ semanal, eu posso caprichar um pouco mais no desenho”, diz o autor.

A escolha da produção e divulgação de uma página por semana acabam resultando em uma adequação da macronarrativa para uma micronarrativa semanal. “Acho que o mais importante quando se tem algo semanal é tentar oferecer alguma coisinha todo episódio, algo que não pareça só um elo pro próximo episódio que só vai chegar na semana que vem“, afirma Francis. Essas escolhas são similares ao trabalho de um quadrinista que trabalha com tirinhas de jornal e que se propõe a realizar, além daquela pequena história, um contínuo maior, uma narrativa mais ampla que une a primeira tira à última, e todas, separadamente, possuem sentido. As tirinhas de Calvin e Haroldo, por exemplo, tem sentido isoladamente, no entanto, nos encadernado que vemos nas livrarias, há uma história com começo-meio-fim naquelas centenas de páginas. No caso de Maldita Karen, há um planejamento a curto prazo (página), médio prazo (capítulo) e longo prazo (história completa).
No fim das contas, é sempre uma questão de planejamento do autor, escolhas de elementos narrativos que fazem sentido entre curto, médio e longo prazo. E, às vezes, de pura inevitabilidade da trama que desenrola na frente do autor. “Isso (cliffhanger) é inevitável”, aponta Francis. “Tem algumas situações dramáticas na história em que os cliffhangers vão aparecer sozinhos“, completa. A nós como leitores resta o papel de editor mental da trama, a pessoa que pega a página da semana passada e linka mentalmente com a dessa semana. Somos tão leitores quanto editores da trama. E eu, particularmente, não vejo a hora de ver até onde a história da maldita, cretina, insensível, insensata, destrutível e amável Karen pode ir.

Siga a Maldita Karen no Facebook e no site. Aproveite para ver a história dela e a de outros personagens importantes da trama no site da Cosmopolia.

PS.: Agradecimentos mais do que especiais ao Francis Ortolan, primeiro por ter criado essa personagem tão legal, segundo por ter respondido com tanta rapidez e simpatia minhas perguntas feitas pelo chat do Facebook.

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