por Alex Costa - Facebook
coluna: Em cada canto um conto
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Na noite em que Inácio nasceu teve festa, era o primeiro a sair dum ventre que ainda guardaria mais oito. No que Inácio me contou, ainda é bastante comum no sertão as mães terem seus filhos em casa, com a parideira no auxílio, tudo ocorria bem. Mostrou-me uma fotografia em preto e branco, de quando criança, um porquinho de gordo. Passou-se pela infância como passa um menino, irmão de mais oito, que a vida põe a viver no meio de um sertão central.
Quixadá não é cidade grande, segundo Inácio, que, embora seja um saudosista de sua terra, fala dela com um quê de beiço retorcido. Menino pobre que fora, sempre teve sonhos bastante limitados e, pelo que me contou, até o sentir da adolescência sua vida parecia estar deveras bem traçada. Seguiria o pai, Severino, plantador de cova rasa, no ramo do sertanejo semialfabetizado, plantador. Os irmãos e irmãs, de igual modo, seguiam sem sonhos. Inácio começou a tremer a voz ao chegar nesta parte, senti que nas entrelinhas haviam ficado muitas coisas, talvez por sentir que, àquela altura, já quase homem feito, deveria servir de referencial aos irmãos, que não estava sendo. Mas a vida tinha outros planos para Inácio.
Se tem coisa que menino de interior faz como menino da cidade, se tem sede igual entre os dois, chama-se bola. Traves de ferro, traves de paus, traves de chinelos no chão, não importa: Inácio dominava a arte da bola nos pés. E foi no campeonato ocorrido em abril que Inácio foi descoberto pelo olheiro. Teve um desempenho gigantesco naquele jogo, se sobressaiu a todos os outros jovens e homens. A proposta fora feita ao final do jogo, um aperto de mãos, a viagem para dali a duas semanas, destino Fortaleza.
No dia da despedida, a família inteira estava na rodoviária, um beijo na testa de cada irmã, um abraço tímido no caçula, a quem Inácio mais se apegara na vida, partiu. O clube era pequeno, um pouco diferente do que o menino imaginara. O sócio do clube pagaria uma “pensão” para o jovem Inácio, que depois descobriu que a pensão era, na verdade, um quartinho que mal cabia sua cama e uma cômoda velha que equilibrava um espelho. A alimentação era regrada e tudo na cidade parecia difícil, surgiu no peito de Inácio saudade primeira de casa. Mas havia algo muito maior dentro dele, isso ele deixava se perceber nos olhos, no brilho dos olhos, uma luz na intensidade do sonho.
Vivia basicamente de treinos e casa, não tinha dinheiro para mais nada que não fosse supervisionado pelo clube, que não lhe dava nada mais do que lhe fora acertado. Frente àquela situação, Inácio decidiu atender as propostas que há tempos recebia, desde que havia chegado à capital, era dinheiro bom que ele precisava, tinha que arriscar. 100 reais por uma hora foi o acordado no telefonema, nunca antes estivera com um homem, não daquele jeito, esteve trêmulo durante todo o dia – até escutar a buzina do carro no dia e hora marcado.
Quando Inácio deu por si estava despido. O homem que estava na cama o via e respirava forte. O dinheiro estava sobre a mesa e Inácio precisava dele. Nunca antes fizera o que agora se consumava, estava tímido e sem jeito, nenhum fogo havia – mas haveria de ter, agora era obrigação. Inácio timidamente deitou naquela cama de olhos fechados, mãos suadas e boca seca – o homem apagou a luz.
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