segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Eu nunca entendi… A rua

por Talles Azigon
Coluna: Vinte Palavras Girando Ao Redor do Sol

O poema do Antonio Cícero diz assim:
"melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos"

Fiquei remoendo esse poema cá dentro quando resolvi sair de casa e dar um pequena volta no quarteirão. Morar em um apartamento ou em um condomínio foi sempre uma espécie de pesadelo para mim, devido a sensação de ficar preso em uma metáfora de gaiola, não são pouco as/os poetas contemporâneos que tecem essa relação.

Fui um menino de casa, eu tinha quintal grande, para além do quintal eu possuía sempre a Maraponga inteira para circular quando como quisesse, é por isso que sempre me ataca esse medo da falta de liberdade.

Há muitos acontecimentos tristes explodindo na minha cidade, no país e no mundo inteiro, por ser poeta, receei colocar mais palavras no vulcão de lama dessa internet, andava procurando palavras boas, palavras de encorajamento, não que a indignação esteja calada, chorei um incontável número de vezes, li o Morte e Vida Severina procurando um punhado de ânimo na alma, e como relatei de início, fui dar uma voltinha.

Lá no meio de tudo, na procura de nexo, percebi como os anos e as invenções maravilhosas do capitalismo têm se esforçado tanto para nos empurrar para dentro de casa. "A cidade é um perigo", "saia de casa não", "volte cedo". A ideia de local fechado seguro é construída nas nossas mentes em detrimento aos locais livres inseguros.

Eu não tenho medo da Rua, mesmo nos incutindo o fato de a rua não ser um bom lugar para as pessoas frequentarem, desnorteio-me procurando entender em que parte da história essa máxima se estabeleceu com tanto afinco. Fui de rua nesses anos todos, poucos vinte e seis anos, nas ruas me aventurei em descobertas amorosas, conheci os amigos, fui espectador de acontecimentos deslumbrantes. Das ruas saem muita matéria para minha poesia.

No meio da rua colocávamos calçadas e ficávamos a olhar o povo que passa, a gente pulava corta, brincava de macaca, se escondia uns dos outros no esconde-esconde, nos encontrávamos.

Ao contrário das casas, simbolo maior do privado, a rua é pública, mesmo esse pública tendo ganhado muitas aspas, a rua tem que ser da união, sempre. Não a União Estado, a união das pessoas.

"A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava"
Carlos Drummond de Andrade

Elas possuem belos nomes, isso quando não foram tristemente renomeadas com nomes de Ditadores ou Políticos vaidosos ansiosos para serem perpetuados na história sem contribuir quase com o bem comum. Na Maraponga, por exemplo, existe a Rua Uirapuru, sempre que passo por ela lembrando seu nome vem-me logo a sensação de canto de pássaro.

Na rua, ainda mora aquela esperança de um encontro de fazer tremer as nossas pernas, aquele encontro prometido depois de alguma despedida chorosa em que alguém diz para a outra:

– Nos esbarramos por aí

com um complemento subentendido: Pelas ruas!

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