por:
Hermes de Sousa Veras
Ligeiramente sombrio. No mais, consideravelmente feliz e tropical.
Coluna: Etnoliteratura
Etnoliteratura deveria
ser algo diferente, embora nada tenha de novidade. A ideia principal é a de
construir textos baseados na experiência, seja ela minha ou de outra pessoa. A
vontade é alinhar minhas indagações enquanto escritor de literatura e
antropologia. Meu objetivo nessas áreas é construir escritos que façam com que
o “Eu” saia do“Mim”, desrespeitando os versos de Hilda Hilst: “Tu não te moves
de ti”. Bem, o “Eu” não precisa sair, caso ele seja descentrado,
desestabilizado, já está de bom tamanho.
As literaturas são
várias e não poderia me interessar por todas. A coluna tenta inserir elementos
de uma antiliteratura[*]
para justamente construir uma literatura. Se o título Etnoliteratura parece
pomposo, ou mesmo arrogante, como já me disseram, cabe dizer que a coluna
chama-se assim por falta de outro nome. Tento nesses textos fazer laboratórios
e experimentos de observação e escrita, exatamente nessa ordem, ao menos quase
sempre. Daí o motivo de se apresentarem como esboços.
Tenho escutado
perguntas do tipo “Isso aconteceu contigo ou com um conhecido teu?”. No geral
os ocorridos são colagens de acontecidos meus e/ou de conhecidos com outros
inventados e delirados. O delírio, aqui, também é observação. Tenho visto
muitos vultos ultimamente, e eles não ficarão de fora dessas linhas.
Como se já pode ter
percebido, nada de novo trago aqui. A literatura tem sido isso mesmo, a junção
de experiências com uma boa dose de criação. Sabemos bem que criação e
experiência são coisas simultâneas, desconjuntadas jamais. Tendo me
justificado, passo a outra questão que já me levantaram: “Vale a pena escrever
o cotidiano pelo cotidiano?” Eu digo que sim. Pois o cotidiano de sicrana(o) é
muito diferente do de fulana(o), e trazer as vidas de pessoas variadas, e disso
aprendermos algo, é um dos objetivos interessantes da literatura. Ainda na
pergunta, ela faz parecer ser tarefa fácil escrever o cotidiano. Quem já o
tentou tem noção o quanto essa ação não é simples, principalmente quando nos
perguntamos o que é o cotidiano e como podemos ter acesso a ele. E claro, o
cotidiano de quem? E para quem? Dizem que a melhor forma de refletir sobre
isso é a escrita da crônica, portanto, às vezes os textos aqui poderão
apresentar esse tom. Mas revelo logo não possuir nenhuma preocupação em relação
ao gênero dos escritos.
Falei logo acima em
aprender. Estou usando a palavra em seu sentido amplo. Pode ser o acesso a
determinado conhecimento mesmo, ou uma sensação estética: os prazeres são equivalentes.
Os escritos buscam trazer efeitos de aprendizagens, caso não para o leitor(a),
ao menos para o escritor. Se trago alguns textos minúsculos, pequenos recortes
de conversas, coisas poucas que acompanhei/inventei em Belém do Pará ou
Fortaleza-CE, cidades que mais vivencio ultimamente, é por dois motivos. O
primeiro, sou preguiçoso. Venero essa disposição estética para com o mundo. A
outra é que não querendo fazer tudo sozinho, deixo, quase sempre, escritos que
possam ser conectados com as preocupações ou brincadeiras das(os) leitoras(es).
Dependo de vocês para fazer o troço todo funcionar.
Claro que essa
explicação/apresentação é meio delírio, meio desejo. O resto vocês completam.
[*]
Termo criado “por” David Gascoyne (1916-2001), poeta
britânico. Descobri isso enquanto escrevia esse texto, portanto o termo surgiu
intuitivamente.
Um comentário:
Antiliteratura? De forma nenhuma chamaria seus textos assim. Precisaria dizer o mesmo de Manoel de Barros. E aí?
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