por Clarita Salgado
twitter: @claritasalgado
instagram: @clarita.salgado
twitter: @claritasalgado
instagram: @clarita.salgado
Coluna: Dois minutos de ódio
PARTE 1 – COMO
TUDO COMEÇOU
No início de 2012 eu comecei
a trabalhar em uma livraria. Naquele processo de novos colegas que trabalham
com livros começando a se conhecer, logo nos primeiros dias, um colega livreiro
me perguntou o que eu mais gostava em literatura. Não precisei nem pensar,
respondi na lata: “Distopias!”.
A reação dele foi um
belo “É o quê, rapaz?!”, com a cara de que quem ouviu falarem algo em árabe, na
língua do P, de trás pra frente!
Este episódio ilustra
bem o destaque a literatura distópica tinha na época: nenhum! Eu já lia,
pesquisava e amava distopias há alguns anos, mas no início de 2012 a grande
maioria das pessoas não lia, não conhecia, não sabia o que era e sequer tinha
ouvido falar a palavra.
Mas aí, lá pelo meio
do ano de 2012, Suzanne Collins mudou tudo! Eu não sei bem porque isso
aconteceu nesse momento histórico específico, já que Jogos Vorazes foi
publicado originalmente em 2008 e já havia sido lançado no Brasil desde 2010, mas
o fato é que ali, em torno de abril e maio de 2012, o Brasil foi invadido por
uma onda de adolescentes e jovens adultos que de uma hora pra outra se
descobriram fãs de literatura de distopia, antes mesmo de ter contato com o
termo que lhe dá nome.
Com o enorme sucesso
da trilogia Jogos Vorazes, aconteceu o que se sempre acontece no mercado
editorial: as prateleiras das livrarias (e das casas) foram invadidas por um
monte de coisas parecidas, lançadas para saciar o apetite de quem já tinha
devorado Katniss e queria mais! Houve um verdadeiro boom distópico e, de
repente, todo mundo era fã de distopias desde criancinha!
“Quem não tem a
inteligência para criar, precisa ter a coragem para copiar.”
Comandante Rolim, fundador da TAM
Nos meses e anos que
se seguiram, apareceram várias outras séries distópicas adolescentes, como Maze
Runner, Feios, Starters, Destino, Reiniciados, Divergente, Sozinhos, Seleção,
etc, etc, etc. Justiça seja feita,
algumas das obras de literatura distópica jovem que pegaram o vácuo de Jogos
Vorazes já haviam sido lançadas antes, nem tudo ali é cópia, e tem muita coisa
de ótima qualidade. Mas não dá pra negar que há uma série de elementos em comum
a estas obras, e que muita coisa foi jogada no mercado para suprir essa demanda
recém-criada.
E o boom distópico
não aconteceu somente no mercado editorial, mas na cultura pop adolescente em
geral. Pelas redes sociais, pela blogosfera literária, pelo booktube (zona
dentro do youtube povoada por leitores que fazem vídeos só falando sobre livros
- sim, isso existe!), pelas livrarias, pelas escolas, pelas salas de cinema
onde passavam as [extremamente lucrativas]adaptações hollywoodianas dessas
obras, enfim, em todos os espaços, legiões de adolescentes se proclamavam não
mais meros leitores, mas grandes fãs e profundos conhecedores da literatura
distópica!
Não bastava ser
#TeamPeeta ou #TeamGale, era necessário sair por aí com a camiseta e o botton, ter
um blog, publicar uma resenha, escrever um post, fazer um vídeo e divulgar a sua
própria listinha de Top Distopias, na qual inevitavelmente tinha de haver uma
ou duas obras menos conhecidas, que estavam ali para legitimar o status de
expert no assunto a quem fez a lista.
E então, a distopia
deixou de ser uma ilustre desconhecida, ganhou os holofotes, virou mainstream,
best seller, blockbuster, congregou uma legião de fãs, deixou um monte de gente
super apaixonada e fez alguns autores e editoras ficarem cheios de dinheiro!
FIM
Não... Pera!
PARTE 2 – SÓ
QUE NÃO!
Lá em cima, no iniciozinho
do post, eu contei que antes de todo esse movimento acontecer, eu já era uma
grande fã de distopias. Mas então, se o movimento é todo pós 2012, como é
possível que eu já gostasse antes?! Como assim as distopias não são uma
invenção do século XXI?!
Por incrível que
pareça (ou não), o grande precursor da literatura de distopia não foi publicado
em 2009!
Eu sinceramente nem
saberia nomear qual foi esse grande precursor, mas certamente ele é um bocado
mais antigo e provavelmente data lá do finalzinho do século XIX. Mas eu sei
quem foi o grande precursor da literatura distópica na minha vida.
Aos meus 18 ou 19
anos, lá em 2004, eu li pela primeira vez um livro chamado 1984, do autor
George Orwell, e aquilo marcou a minha vida. Foi exatamente como me apaixonar,
me encantei logo nas primeiras páginas e voltei ao começo várias vezes pra
aproveitar de novo. Quando finalmente comprei o livro, fui lendo devagarzinho,
saboreando e economizando pra ele não acabar. Desde o início eu sentia que
aquele seria o livro da minha vida. Lembro-me do momento em que terminei de ler
a última frase e pensei “Acabei de ler o melhor livro da minha vida. Não há
mais nenhum degrau pra subir. E agora?!”.
A partir dali foi tudo
lindo, tudo novo! Como eu estava apaixonada pelo livro, queria saber tudo sobre
ele, então fucei a internet caçando tudo que pude encontrar. E tem muita coisa
na internet sobre 1984! O assunto deste texto não é 1984, um dia eu vou falar
bem melhor sobre ele, mas aqui vale fazer duas ressalvas. Primeira: eu ainda
considero 1984 o melhor livro já escrito, ainda o releio pelo menos uma vez ao
ano e em todas as vezes confirmo esta opinião! Segunda: 1984 foi a minha porta
de entrada para as distopias e não poderia haver melhor guia para me levar!
Nestas minhas
pesquisas sobre 1984, uma palavra aparecia repetidamente: distopia. Ele aprecia
frequentemente listado como uma das distopias mais importantes de todos os
tempos, o que me fez querer saber o que era uma distopia e quais eram as outras
da lista. E foi a partir daí que eu encontrei a grande paixão da minha vida: as
obras de distopia!
Livros, filmes,
quadrinhos, contos, séries, ensaios, curtas, animações, videogames... O mundo
das obras distópicas é extremamente vasto e suas fronteiras são bastante
flexíveis, ainda bem! Há obras eminentemente distópicas, mas há também muita
coisa que alguns classificam como distopia e outros não, o que eu acho ótimo,
porque enriquece o debate e não engessa o assunto! Há grandes clássicos, obras
contemporâneas, uma série de subgêneros, autores icônicos, autores obscuros,
distopias “óbvias”, obras de caráter distópico discutível... É um assunto
vastíssimo, que me fascina e me entretém completamente há anos!
Depois do boom de
literatura distópica pós Jogos Vorazes, frequentemente as pessoas pedem a minha
opinião sobre o assunto, porque sabem que eu sou apaixonada pelo tema há muitos
anos. E quando eu digo que acho ótimo, muita gente se surpreende.
Sim, eu li a série
Jogos Vorazes! E vi os filmes no cinema. E li Divergente, Feios, Caçadores... E
estou só esperando a estreia de Insurgente pra ir ver no cinema. Porque eu adoro
distopias, ora bolas!
Eu nunca entendi
direito esse pessoal que adora de uma coisa que não é famosa e que, quando
aquilo vira moda, torce o nariz e diz que agora não gosta mais. Eu, na condição
de fã antiga, conhecedora apaixonada e grande curiosa sobre as obras distópicas,
fico é feliz pra caramba em ver o meu estilo literário favorito bombando!
Eu quero mais é que
todo mundo leia Divergente mesmo! E que as salas de cinema de Jogos Vorazes
fiquem lotadas! E que a internet transborde de textos, blogs, fóruns, vídeos,
resenhas, comentários e opiniões sobre estas obras!
Mesmo eu ainda
achando que nenhuma destas obras contemporâneas se iguala a um Admirável Mundo
Novo ou um Fahrenheit 451, eu acho que estas obras também trazem algumas ideias
muito interessantes sobre cenários distópicos e, principalmente, eu acredito
que elas funcionam como porta de entrada para o maravilhoso mundo da literatura
distópica, onde este público mais jovem poderá conhecer grandes mestres, gênios
como George Orwell, Kurt Vonnegut, Anthony Burgess, e muitos outros!
Quando fui convidada
a escrever uma coluna aqui sobre distopias, eu fiquei muito feliz com o
reconhecimento de que este é um assunto que eu conheço, claro. Mas fiquei muito
mais foi empolgada com a perspectiva de escrever sobre um assunto que eu adoro,
fazer uma propaganda apaixonada da literatura distópica para quem ainda não
conheça e, de quebra, ter a chance de trocar ideias com outros fãs do assunto
que estão por aí e podem aparecer por aqui.
Espero e torço para
que este espaço sirva para trocarmos ideias sobre obras, autores, movimentos,
gêneros, clássicos, novidades e tudo mais que tiver relação com arte distópica!
Podemos também conversar sobre a história das distopias, as definições, as
fronteiras, os termos usados, os rótulos. E acho que vai ser muito interessante
tentar sair da caixinha de livros e filmes distópicos e tentar achar uma
música, uma poesia ou quem sabe até uma pintura ou uma escultura que possam ter
esse olhar da distopia. Quem sabe, né?
Longe de mim achar
que sou uma expert em distopias ou que posso ensinar quem quer que seja sobre o
assunto. O que eu tenho é uma grande paixão, uma curiosidade infinita, uma
estante recheada e uma enorme vontade de trocar ideias sobre distopias com
qualquer pessoa que compartilhe deste mesmo interesse. Se este for o seu caso,
volte no mês que vem, que a gente continua trocando ideias sobre DISTOPIAS!
5 comentários:
Distopias são muito massa e é incrível encontrá-la em tudo que é arte! Estou com boas expectativas sobre essa coluna!
Excelente texto! Dinâmico, bem escrito e envolvente.
Gosto muito de distopias cinematográficas e literárias, mas graças a você, acho que finalmente entendi a arte de meu amigo Bruno Dourado.
PS. : estou escrevendo um livro distópico.
muito legal este texto, gosto quando é uma escrita tão parcial e pessoal assim pois a gente vê como o que está escrito é sincero e de verdade. minha distopia favorita? gosto muito de Fahrenheit, mas atualmente gosto mais de Partículas Elementares, pois diferente do mais comum, o mundo atual é muito mais perverso do que o mundo futuro retratado no livro, do mesmo autor e mais Nerd ainda tem o A Possibilidade de Uma Ilha. :)
tão dificil achar alguem que escreva bem assim hoje em dia... queria ter uma irmã assim :)
Valeu por me fazer conhecer um pouco esse mundo que eu ignorava
Postar um comentário