quinta-feira, 17 de março de 2016

Intolerâncias e livros

por:
Hermes de Sousa Veras
Ligeiramente sombrio. No mais, consideravelmente feliz e tropical.
Coluna: Etnoliteratura


“Tropeçavas nos astros desastrada
Quase não tínhamos livros em casa
E a cidade não tinha livraria
Mas os livros que em nossa vida entraram
São como a radiação de um corpo negro
Apontando pra expansão do Universo
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
(E, sem dúvida, sobretudo o verso)
É o que pode lançar mundos no mundo”
Caetano Veloso - Livros


Intolerância I:
O resgatador de almas chutou o livro objeto de minha atenção. A passageira ao meu lado, assustada, empurrou quem estava no caminho e sentou-se em outro lugar. Ainda sem reação, por conta do inacreditável ato do rapaz, continuei sendo expectador.
– Pra que tu tá lendo isso aí, se eu te ofereço a palavra de Deus?

Intolerância II:
O homem, ao subir no ônibus, fez questão de se diferenciar dos outros: não seria pedinte, não inventaria nenhuma história triste e, principalmente, não faria nenhuma pregação. Revelou estar desempregado e que simplesmente gostaria de vender alguns chocolates feitos pela esposa, nenhuma ladainha seria dita, nenhuma falsa pregação.
Ao passar por mim, perguntou:
– Que livro é esse?
Mostrei a capa,o rapaz leu “Religião”. Era um livro sobre gênero, simbolismo e religião, que abrigava artigos científicos sobre as religiões na Amazônia. Ignorando todos esses detalhes, sentenciou:
– Eu não gostei desse livro, nem religião eu tenho. Elas são responsáveis por todos os males desse mundo, não é?
Não respondi. Com seu ar superior, terminou de vender seus chocolates racionalizados e desceu amargando a minha semana.


2 comentários:

CA Ribeiro Neto disse...

Embora sabendo que essa coluna é de um solo híbrido entre realidade e imaginação, é difícil acreditar que algo dos fatos aconteceu...

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.